Perspectivas sobre o câncer de próstata

Visando a divulgação do Novembro Azul, a MEDPUC realizou uma entrevista com o Prof. Ronaldo Damião, professor de especialização em Urologia da Escola Médica de Pós-Graduação da PUC-Rio. Os principais temas abordados envolvem o câncer de próstata, os preconceitos que envolvem o diagnóstico e a campanha internacional do combate à doença. O especialista contou com o apoio e a participação do Prof. João Schiavini, MD e PhD em Urologia.

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Por que esse tipo de câncer é mais comum em homens maiores de 60 anos? Tem alguma mudança hormonal que aumente o surgimento do câncer da próstata com essa idade?

A maior incidência do Câncer de Próstata nos homens acima dos 60 anos de idade é uma constatação estatística. Considerando-se a população masculina mundial, desde que ultrapassem a 7ª ou 8ª décadas de vida, 1 em cada 6 homens vai ter um Câncer de Próstata. É o segundo câncer mais frequente nos homens, superado apenas pelo câncer de pele e é o segundo que mais mata os homens, só perdendo para o câncer de pulmão, um órgão vital. No Brasil, segundo dados do INCA, estima-se que em 2014 serão diagnosticados cerca de 69.000 novos casos de Câncer da Próstata e que cerca de 13.600 homens irão morrer desta doença, o que dá uma morte a cada 30 minutos. A relação do Câncer de Próstata com a idade se manifesta de maneira distinta entre as várias populações masculinas do planeta, concentrando-se ou evanescendo de acordo com determinadas circunstâncias regionais e ambientais. O Câncer de Próstata é uma doença de origem multifatorial e a idade longeva é o principal fator de risco, por favorecer o efeito cumulativo dos outros diversos fatores de risco ao longo dos anos de existência do homem. Embora não se consiga atribuir maior relação a um único fator, sabe-se, também com base em dados estatísticos, que alguns fatores contribuem mais para a maior ocorrência do Câncer de Próstata nos homens longevos, como a ingestão de gordura de origem animal ao longo da vida, a ingestão crônica de álcool, o hábito tabágico prolongado, a obesidade, o sedentarismo, doenças inflamatórias da próstata, sejam de origem sexual ou não, além da herança familiar e da etnia (o Câncer de Próstata é muito mais comum entre homens negros do que em brancos).  

A partir de que idade é necessário fazer o exame do toque?

Devemos considerar que o Câncer de Próstata, por ser praticamente assintomático na sua fase inicial, tem o seu diagnóstico muito dificultado e retardado, se formos esperar pelos sintomas. O diagnóstico precoce, no entanto, permite a cura em até 95% dos casos, se o tratamento adequado for feito na época mais oportuna. Na população geral masculina, considera-se que o exame digital da próstata, também conhecido como "toque retal", deva ser feito anualmente a partir dos 50 anos de idade, acompanhado da dosagem também anual do Antígeno Prostático Específico (PSA). A associação dos dois exames aumenta a sensibilidade da detecção precoce do Câncer de Próstata. Nesta mesma população, homens com idade entre 45 e 50 anos podem fazer apenas a dosagem do PSA. Caso haja histórico familiar de Câncer de Próstata em parentes do 1º grau (pai e irmãos) ou se trate de um homem negro ou as duas condições simultaneamente associadas, os dois exames devem ser feitos anualmente a partir dos 40 anos de idade. O toque retal, apesar de desconfortável, é rápido e não dura mais do que 10 segundos. Permite, porém, examinar até 70% da superfície da glândula prostática, exatamente a região da glândula onde ocorre a maioria dos Cânceres de Próstata.

Está havendo um aumento no número de homens que buscam fazer o exame?

Sim, graças às campanhas que vimos efetivando ao longo dos últimos anos. A população masculina tem, aos poucos, se convencido e conscientizado da importância de se submeter à avaliação prostática que permite a precocidade dos diagnósticos e, em muitos casos, a cura da doença.

Ainda existe o tabu em relação ao exame entre os homens?

Infelizmente, ainda há homens que resistem a se submeterem ao exame da próstata, motivados por uma sensação cultural de invulnerabilidade masculina, como se o câncer só fosse acontecer nos outros, pelo medo de que se diagnostique o câncer, que se estiver lá, é melhor que seja encontrado e devidamente tratado, por medo de sentir dor ou por acharem que isto porá em questão a sua virilidade, o que não é verdade em absoluto. Há outros que resistem por receio de o tratamento do Câncer os deixar impotentes ou incontinentes, como se isso fosse mais importante que sobreviver ao câncer. Estas consequências costumam ser mais prevalentes nos pacientes mais idosos e são perfeitamente tratáveis. Esses tabus expõem um ainda grande número de homens às graves e absurdamente sofridas consequências de pacientes com Câncer de Próstata diagnosticados nas fases tardias da doença, quando apenas se pode tratá-los com cuidados paliativos, tendo a sua sobrevivência limitada e submetendo-os a terríveis níveis de sofrimento e desconforto.

Quais são os outros exames que também devem ser feitos buscando a detecção precoce?

A dosagem do Antígeno Prostático Específico (PSA) é complementar ao toque retal para o diagnóstico. Tem pouco valor quando feita isoladamente, no entanto, visto que há cânceres de Próstata que não aumentam o PSA e isto mascara e retarda o diagnóstico.

Estão sendo desenvolvidos novos métodos para diagnosticar o câncer?

Neste momento há vários outros métodos de exames laboratoriais em pesquisa e desenvolvimento para a detecção precoce do Câncer de Próstata. Todos, no entanto, são complementares ao toque retal, que deve ser sempre considerado o exame principal. Sempre há, entretanto, por questões operacionais, um grande período de demora entre a pesquisa e desenvolvimento de um método de exame e a sua aplicabilidade clínica.

Existem fatores que aumentam as chances de uma pessoa ter esse câncer?

Os fatores de risco e seus efeitos são cumulativos, tanto entre si próprios quanto ao longo dos anos de vida. Por exemplo, compreende-se que seja muito mais provável que um homem negro, com mais de 60 anos, cujo pai e um irmão tenham sofrido do Câncer da Próstata, sendo ele obeso consumidor contumaz de carne vermelha, alcoólatra e fumante inveterado, sedentário e que tenha sofrido de várias inflamações na próstata desenvolva um Câncer de Próstata. Este quadro, infelizmente, não é tão infrequente na nossa população masculina. 

Existe algo que possa ser feito para evitar ou retardar o aparecimento?

Evitar todos os fatores de risco sobre os quais se pode interferir, como a dieta rica em gordura animal, os hábitos alcoólicos e tabágicos, as inflamações prostáticas, principalmente as de origem sexual, o sedentarismo e a obesidade, já que a herança familiar e o fator étnico não podem ser modificados. Não se pode garantir que o câncer não acontecerá, porém é de se supor que esta probabilidade será reduzida.

Quando foi criado o novembro azul?

Há mais de 10 anos, nas nossas primeiras campanhas para conscientizar os homens que o Câncer de Próstata pode ser curado se detectado precocemente, estabelecemos o dia 17 de novembro como o Dia Internacional do Combate ao Câncer da Próstata. Mais recentemente, com os resultados bem sucedidos das campanhas, resolveu-se estender o movimento a todo o mês de novembro.  

O senhor acha que essas ações e/ou campanhas ajudam efetivamente? Os homens procuram os médicos após essas ações?

Sim, nós verificamos um efetivo aumento da procura pelos Serviços e Consultórios de Urologia por parte dos homens, público alvo das campanhas contra o Câncer da Próstata. Consideramos este resultado bastante favorável aos homens. As vidas que conseguimos poupar e o sofrimento que conseguimos reduzir compensam qualquer investimento em campanhas como essa do Novembro Azul. Os resultados favoráveis compensam e superam em muito os custos e, muito mais importante, dissemina-se e impregna-se entre os homens a noção de que devem se cuidar para poderem viver mais e melhor.

 

 *Entrevista realizada por e-mail com o Prof. Ronaldo Damião e Prof. João Schiavini, mediada por Isabela Dias de Oliveira.